22 de setembro de 2008

Dois meses sem vovô

Eu não conto de propósito.
Juro.
Eu não fico me martelando, escrava de registros e datas e recordes e médias e cálculos, para que os números me saltem à mente.
Eles simplesmente vêm.
Eu simplesmente sei que dia é hoje, quanto tempo se passou...
Eu associo memórias logicamente, mesmo que eu não queira. Meu esforço, às vezes, é para deixar de lembrar sempre, deixar de saber que dia é aquele.
E hoje faz dois meses que meu avô morreu.

10 de setembro de 2008

Acolhimento

Quando eu era pequena, dormir na casa de meu pai sempre era o ato final de um dia gostoso. Como a gente não se via muito, como não havia convívio diário, os encontros com ele eram preparados para ser especiais: dias cheios, idas e vindas, passeios, sol, risadas, almoços e jantares, tudo cheio de alegria. Minhas memórias sobre isso são deliciosas, as sensações que me vêm são de muita satisfação e felicidade.

Depois que as horas passavam e as atividades se esgotavam, chegávamos em casa exaustos, eu e Pedro, meu irmão mais velho, mas nunca livres da árdua tarefa de encarar banho e escovação de dentes. Era difícil manter olhos abertos àquela altura...

Enquanto, então, nos vestíamos e preparávamos as coisas para o dia seguinte, meu pai ia cumprir também o seu ritual. Prontos, eu e Pedro deitávamos e esperávamos ele voltar. Aí meu pai, sereno, entrava no quarto, desdobrava os cobertores já colocados nos pés das camas, sacudia para deixá-los bem soltos e, num movimento embalado umas duas ou três vezes antes do levantamento final, ele cobria cada filho. Um beijo no rosto, um "boa noite" suave no ouvido e o apagar da luz embalavam o sono de modo incomparável.

A soma daquilo tudo – cansaço feliz, banho tomado, lençol limpinho e cheiroso, o ventinho que ainda hoje consigo sentir, o toque do cobertor sobre o corpo e a presença intensa do meu pai – faz esta cena ser a minha maior referência de carinho.
Para mim, não há gesto mais carinhoso do que cobrir alguém.