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25 de janeiro de 2011

Desintoxicação

Certa vez, passei um dia inteiro à base de uma lista de tenebrosos sucos de misturas de ingredientes que não combinam, coisas como maçã com espinafre, beterraba e ervilha, porque aquilo prometia desintoxicar meu organismo. Há infidáveis receitas e dietas de desintoxicação que nunca soube direito se realmente têm fundamento. Mas eu tentei. Às vezes a gente sente esta necessidade de limpeza.

Estar numa cidade cuja até lógica do trânsito é invertida em relação àquilo que vi em todos os momentos dos meus quase 30 anos tem sido uma efetiva e completa lavagem. Tudo se renova diante do olhar, dos ouvidos, de todos sentidos. Os cheiros são novos, os gostos também, a textura do ar é outra, o frio me aquece intimamente e os símbolos precisam ser decifrados. É uma desintoxicação ambiental. E de alma. Limpa tudo para abrir espaço ao que é desconhecido e que me pede atenção em cada rua atravessada, cada tentativa de diálogo, cada vez que me perco entre as moedas que não me são familiares. Nada é automático. Nada é por costume, rotineiro, cansativo, repetitivo. Nenhuma paisagem é comum nem passa sem ser vista. Tudo se absorve. O óbvio torna-se inexistente. Todo segundo que se concretiza é uma nova surpresa que torna o dia mais inteiro. Mais meu. Mais eu. É preciso estar muito consigo para viver a experiência de desvendar o que nos cerca.

É deliciosamente esquisito não estar localizada, não ter um background que anteveja o que há na próxima esquina, na próxima abordagem. São rostos e tipos diferentes, arquitetura deslumbrante, um emaranhado de línguas e sotaques, tanta coisa para descobrir. Ao mesmo tempo, é fantástico, a cada dia, começar a reconhecer a segurança de que sei voltar pra casa, e desenvolver habilidades. Sozinha. É sozinha que tenho estado a maior parte do tempo, mesmo que acompanhada por gente que nunca vi antes, e que não verei de novo. Sozinha dormirei esta noite, o que estranhamente causa uma sensação de pertencimento. Estou pertencendo a Londres e Londres parece existir só pra que eu esteja aqui, amando tudo.

2 de junho de 2009

Eu tenho uma camiseta escrita eu te amo

Minha história com Wander Wildner começa em São Paulo. Eu estava lá, numa temporada muito proveitosamente solitária de pouco mais de trinta dias, catando experimentar tudo e conhecer gente e zanzar o máximo possível por aquelas ruas cujos cheiro (ainda que poluído) e temperatura tanto me agradam. Era 2006. Clóvis, meu amigo carioca, quis contribuir para o meu processo de socialização e passou ficha completa de : fala com ela, marca com ela!

Precisei respirar fundo para fazer o que me parecia meio ridículo e procurei a menina. Eu tinha o e-mail, o telefone, o orkut, o msn, mas não lembro qual via escolhi para o primeiro contato. Só sei que depois do “oi” a gente ficou se falando por todos os meios para conseguir definir com segurança o quê faríamos juntas – e como seria a logística para que eu não me perdesse no ainda desconhecido mundo paulista.

Então ficou decidido que nos encontraríamos numa estação de metrô onde ela e o (agora ex) namorado estariam me esperando. Eu estava meio tensa com a situação de sair com desconhecidos, não por medo das consequências da velha instrução de não falar com estranhos, mas porque não sou boa nessas coisas de simpatia gratuita, de fingir que tô gostando, fiquei logo maldizendo, pensando no que faria se ela fosse uma chata, se faltasse assunto, se eu quisesse fugir.

Fiquei sentada num banco pensando se desistia ou não enquanto aguardava reconhecer em meio à multidão a menina que ela me descreveu ser. Ela usou um bom macete para ser facilmente identificada. Seguimos para o local do show, eu meio sem saber o que a fez escolher tal programa, mas não estava em condições de impor minhas más vontades.

Wander se apresentaria às 20 horas e a bilheteria seria aberta às 19. Chegamos antes para pegar lugar na fila, ainda que para mim aquilo tudo fosse estranho – chegar antes, horários pontuais, fila para ver Wander Wildner. Minha pequena veia jornalística me fez perguntar a razão de tudo e ela disse sim, o show começa pontualmente, sim, a fila se organiza com antecedência, sim, são poucos ingressos e devem esgotar, não, você não consegue pagar meia se não tiver carteirinha de estudante, como assim esta história de meia é institucionalizada em Salvador?

Quando nos reunimos com o resto da galera, mais um meio mundo de gente animada, seguimos para a fila e não contive a surpresa: nossa!, e não é que tem mesmo gente que quer ver esse cara! Comentário infeliz, estava rodeada de fãs, um deles se identificou e pediu respeito, o que é, menina?, Wander Wildner é rei. Ficou ofendido e balançando a cabeça, nitidamente indignado com minha ignorância.

Eu e minha turma de desconhecidos arrumamos um bom lugar na plateia porque entramos cedo. Nunca que eles correriam o risco de ficar longe da majestade. E eu cada vez mais chocada ao ver o lugar ser lotado com legítimos admiradores que eu não imaginava existirem.

Quem abriu a noite foi Juninho Bill. Yes, Juninho Bill, do Trem da Alegria, uma das minhas fulminantes paixões platônicas infantis, à frente de uma banda de rock cujo nome não gravei e que, como podem ver, não vingou. Não sei dizer se era boa ou ruim, se gostei ou não, porque eu só conseguia reparar no Juninho Bill crescido, reconhecendo nele os gestos, danças e traços do ídolo a quem assisti fazer bagunça no Chacrinha.

Eis que chega a hora de Wander. A despeito de todo traje surrealista que destaca a esquisitice de sua figura, ele veio tranquilão, estilo tô em casa, sem pose nem sinal de que eu pudesse estar certa – porque pensei que ele se surpreenderia com a atitude da moçada delirante, fiquei certa esperando a cara atônita dele diante daquilo, mas não flagrei nele nenhum vestígio de que fosse uma resposta fora de padrão.

Daí para frente, as minhas surpresas foram sucessivas: o povo em êxtase, o coro geral, a banda de coroas, a naturalidade, a baixista de botas surradas e cabelos lindamente curtinhos que cantarolava as letras escrachadas com simpatia e dançava de um jeito que eu involuntariamente passei a imitar. Quando dei por mim, eu estava sacolejando animada e me divertindo de modo incomum para quando me deparo com a apresentação musical de um artista que desconheço. Adorei.

De volta a Salvador, meu computador foi presenteado com parte da discografia do rei do rock brega, se é que isso existe e se cabe eu chamar assim.

No dia 9 de dezembro de 2007, Wander Wildner tocou no Festival BoomBahia e eu fui, animadíssima, disposta a fazer fila com antecedência, revê-lo. Fui na raça, porque estava na ressaca do dia anterior, mas me mantive firme e forte. Desta vez, além de Georgia Branco no baixo, tinha também outra dona moça na banda, a baterista Pitchu.

Na hora do show, subi num troço lá para ter visão privilegiada e espaço para exercer meus ímpetos cafonas incentivados. Num dado momento, durante uma balada facada-no-rim, bailei meu balé impecável, na ponta dos pés, no movimento de braços e mãos. Numa manobra da dança, virei para trás e vi uma criatura me olhando com cara de “que porra é essa?”. No susto envergonhado, saltei do meu posto e saí correndo em busca de comprar uma cerveja. Quando retornei, para meu vexame completo, estavam a tal testemunha e Rafaela, minha acompanhante naquele dia e em tantos outros, batendo papo. Nos instantes em que estive ausente, se conheceram não sei ao certo como, e Rafaela já estava apta a nos apresentar: Paula, este é Lubisco; Lubisco, esta é Paula. Houve algum comentário sobre minha bela dança e tratei de me afastar.

Wander Wildner voltou em abril de 2008, tocou no Pátio do Icba, e fui levar Minha Noiva para conhecê-lo, insisti que foram feitos um para o outro. Rir pouco é bobagem. Fantástico. Fantástico.

Sábado passado, eu estava andando em Dinha com Lubisco, que agora é meu-meu-meu, e me deparo com o cartaz:
- Baaaaaaaaaby, vai ter Wander Wildner! Vamo, vamo, vamo!




10 de junho, quarta, 23 horas (véspera de feriado)
Na Boomerangue
Wander Wildner - acompanhado por Ricardo Cury e Tiago Aziz!
+ Os Irmãos da Bailarina + Dj Cassicas
R$ 15

11 de setembro de 2007

São Paulo é menor que Salvador ou O acaso paulista é lindo

Quinta-feira, dia 6. Eu e Rafa chegamos em São Paulo, arriamos as malas no hotel e saímos famintas para comer pizza na Augusta. A idéia era acalmar o estômago, voltar feliz para um cochilo e, então, encarar banho e festa.

Andando contentes pela rua, batendo papo distraídas, Rafa, que bem conhece minha fixação - agora em total crise - pelos cabelos curtos, avista uma bela morena com um corte lindo de doer. Olhou e ia me mostrar e não entendi quando ela ficou meio congelada com cara de dúvida (por que parou, parou por quê?).

- Aquela ali não é Renata?
- Ahn?
- Olha ali, é Renata?

Caraaaaaalho, não acredito! É grito, é pulo, é abraço e Renata, amiga carioca que mora em Sumpaulo, ordena: lógico que vocês vão sentar aqui para tomar uma cerveja comigo e brindar o grande encontro casual. O que era para ser um copo vai virando um monte de garrafa vazia na mesa, quando Renata comemora: caraaaaaaaaaalho, não acredito! Era Rodrigo, amigo dela, chegando no boteco, outra aparição não-prevista. "As baianas" foram devidamente apresentadas e foi vez da ordem dele: juntem-se a nós. Num instante, estávamos com um bolo de gente, papo sem fim e aquela delícia de conhecer mais gente boa deste mundo. Rodrigo e Rubens ganham troféu de quero-ser-amiga-deles.

[Da esquerda para a direita: Rafa, eu, Vitor, Renata, Rubens, Tina, Rodrigo e Paula, no Escócia, boteco na Augusta - aquele paraíso na Terra -, num dos encontros casuais mais legais da história da humanidade.]

Algumas horas depois, tomamos coragem de abandonar o povo para encarar o banho e tal e tal. Passamos numa banca de revista e... Caraaaaaaaaaalho, não acredito! Danilo, um querido paulista do coração, me aparece perdido por lá - tempo de dar um abraço e marcar umas coisas e tudo mais. Oba.

A noite foi parar na Loca e estava eu lá, dançando na minha, quando me vem outra surpresa.

- Lemu?
- Paulinha!
- Caraaaaaaaaaalho, não acredito!!!

Lemuel é lindo, mora no meu coração e eu não o via há anos. Bom demais dançar com ele, trocar umas risadas, falar um pouco da vida.

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Sexta-feira, dia 7. Andávamos à tarde pela rua e nos cruzamos numa esquina com Rodrigo. Êêêêêêêêê! Neste mesmo dia, em momentos e lugares diferentes, esbarramos com ele três vezes. Na última, nos convencemos de que o universo estava conspirando para nos unir e marcamos encontro pro dia seguinte.

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Sábado, dia 8. Acordo e tem mensagem de Rabuja contando que Dani está chegando em Sumpaulo. Dani também é do Rio e encontrá-la era obrigação. Passamos o dia trocando mensagens e telefonemas interurbanos para acertar as coisas. À noite, enfim juntas:

- Você está hospedada onde?
- Num hotel na Consolação.
- Qual??
- O Formule 1.
- Nós tambééééém!!!
- Puta merda, qual o quarto de vocês?
- 1863.
- Caraaaaaaaaaaalho, não acredito, estamos separadas por apenas uma porta.
- Jesus, a gente fazendo interurbano estando lado a lado.

Neste mesmo dia, passamos uma tarde deliciosa com Rodrigo e Rubens. Baião de dois, cerveja, lojinhas, feirinha. Rodando em meio ao chorinho da Benedito Calixto, Rafaela faz cara de dúvida outra vez:

- Paula, ali é Felipe?
- Ahn?

Caraaaaaaaaaaaaalho, tá foda, não acredito. Felipe, amigo de Salvador, estava também rondando por Sampa no feriadão.

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São Paulo é muito pequena, só pode.

31 de maio de 2007

Alguma coisa acontece no meu coração

Aos vinte anos, eu ainda não conhecia o Rio de Janeiro. Uma grande amiga minha estava morando lá e, em uma conversa por telefone, ela disse: venha me ver, venha para meu aniversário. Eu, de supetão, confirmei: eu vou. Entrei no site, comprei passagem e gritei durante meia hora de tanta felicidade. Não planejei nada, não reservei dinheiro, não sabia onde ficaria hospedada, apenas estava ali, com passagem em mãos. E fui.

Eu tinha loucura de conhecer a cidade maravilhosa. E, lá, eu passei todos os segundos hipnotizada por tamanha beleza, vibrando com cada vista, babando cada lugar, curtindo cada detalhe. Foi uma viagem indescritível. Fiz todas as farras, todos os programas de turista e ainda assisti ao show de Eric Clapton. Surreal. Poucas vezes na vida tive dias tão felizes, livres e legais. Ainda carregava a satisfação única de estar fazendo tudo aquilo com meu próprio dinheiro. Minha primeira viagem bancada pelo suor do meu trabalho. Foi lindo.

[Feliz da vida, como vocês podem ver.]

Aos vinte e quatro anos, eu ainda não conhecia São Paulo. Meu pai decidiu que queria fazer uma viagem legal com a mulher e os quatro filhos, pela primeira vez. A gente já tinha ido para coisas ali na esquina, mas todos juntos, gato, cachorro, periquito e papagaio, pegar mala, avião e ir para outra cidade, nunca tinha rolado. Então ele decidiu: vamos todos pra Sumpaulo.

Eca. Eu não tinha interesse algum de conhecer São Paulo. Achei uma escolha ruim, mas, enfim, vamos nessa, viajar é sempre bom, lá vou eu aguentar tijolo, cimento, trânsito e poluição. Ao contrário do que aconteceu quando fui ao Rio, saí de Salvador meio de nariz virado, não era a coisa mais animadora do mundo.

Me fudi. Eu amei cada segundo de São Paulo muito mais do que amei o Rio de Janeiro. Me senti completamente à vontade, em casa, fiquei encantada. Voltei fã, voltei querendo ficar.

[A família reunida na Paulista.]

Alguns disseram que tanta satisfação era fruto de eu ter ficado pouco tempo, cinco dias, em época de feriadão, cidade vazia, como turista, só vendo o lado bom. Pois bem: sete meses depois, fui para "morar". Foi por pouco mais de um mês, mas não como turista. Fiquei na casa de meu primo, trabalhei na Avenida Paulista, aprendi horários dos ônibus, fazia mercado, tinha uma rotina de moradora. Voltei mais fã ainda, voltei mais querendo ficar ainda.

[Almoço com o querido povo do trabalho no dia da minha despedida! Snif, snif...]

São Paulo me fascina. Tanto que me sinto em abstinência permanente, desde que cheguei eu quero voltar lá, nem que seja para dar uma volta nas ruas e sentir o cheirinho da poluição, nem que seja para só uma vez saltar em uma estação qualquer de metrô e sair andando sem rumo, descobrindo pequenos tesouros pelas ruas.

Faltando dois dias para completar meus vinte e seis anos, Arturo me chamou de novo: vamos, peste, vê se dá para você ir. E eu, que já havia algumas vezes negado participar desta viagem dele, programada há tempos, decidi: eu vou. Entrei no site, comprei passagem e gritei durante meia hora de tanta felicidade. Não planejei nada, não reservei dinheiro, não sabia onde ficaria hospedada, apenas estava ali, com passagem em mãos. E vou.

São Paulo, semana que vem, depois de quase um ano, a gente se encontra e mata as saudades. Me aguarde.

2 de maio de 2007

Capão de botas

7 de setembro, no ano passado, caiu numa quinta-feira e foi aquela coisa: todo mundo enforcou a sexta e virou feriadão, ótimo para viajar. Rolou de o Capão nos chamar loucamente, a gente tinha de ir e pronto. Mas, dentre outros motivos menos importantes, uns amigos queridíssimos meus chegariam de Sampa no dia 8, e eu queria vê-los, iria ficar puta se eles passassem por Salvador e a gente não se visse. Então convenci Angelo e nós compramos a passagem para o sábado de manhã cedíssimo e voltaríamos no domingo, de noitão tardíssimo. Só a gente mesmo para topar ir para o Capão num dia e voltar no outro. Enfim. Conseguimos reservar duas camas num quarto de albergue, tudo certo.

Dany, Paty e Marreco, meus troços do meu coração, resolveram embarcar na parada. Estava todo mundo sem grana e calhou perfeitamente: para ir num dia e voltar no outro, o gasto seria pequeno e eles aturariam nem dormir, caso não arranjassem onde se encostar. Eles prepararam tudo: fizeram mercadão com cheque ultra-pré-datado, com tudo que era necessário para a viagem, para a fome e para a bebedeira, separaram isopor, colchão, travesseiro, o escambau.

Na sexta à noite, enquanto Dany, Paty e Marreco arrumavam o carro e o transformavam num quarto de hotel de luxo, eu e Angelo saímos com os amigos de Sampa - isso depois de eu ter passado o dia inteiro com eles, das dez da manhã às oito da noite, mostrando a cidade, de Itapuã a Bonfim, parando em todos os pontos clássicos. Os levamos ao Póstudo (amigo meu que vem conhecer meu mundo tem de conhecer o Póstudo) e, papo vai, papo vem, desce cerveja sem fim, oito mil rodadas de miolo de macaco, rosca, aquela farra. Como sempre acontece (e eu nem sei como eu volto ao Póstudo se reclamo tanto do atendimento de lá), fomos interrompidos pela conta sendo posta em cima da mesa, sem ninguém pedir. O bar fechou, fomos expulsos e, claro, eu queria mais: vamos pra onde?, vamos pra onde?

Ninguém se animou, os paulistas estavam exaustos, Angelo só falava do ônibus que sairia às seis da manhã. Ok. Deixei os meninos no hotel e avisei a Angelo, toda querendo mais: "Se formos para casa, teremos duas horas de sono e você sabe que eu não vou conseguir levantar, é melhor a gente dar virote e ir direto, vamos beber mais em algum canto, vai ser ótimo porque vamos dormir a viagem inteira". Ele discordou. E se comprometeu a me arrancar da cama - um trabalho e tanto. "Ok", eu disse, "então vou dormir, você quem sabe, vai dar merda isso...".

E deu. Quando abri o olho uma hora lá de manhã por sentir que algo estava estranho, Angelo estava me olhando com cara de "fudeu". Já ia dar oito horas. Merda!! Eu sabia!!!

Liguei correndo para Dany, sem muita esperança porque eles tinham dito que sairiam antes do amanhecer. "Amiga, você já está na estrada??". E, eba, eles também tinham dormido mais do que pretendiam e estavam de saída àquela hora. E eu: "Dany, pelamordedeus, perdemos o ônibus, podemos ir com vocês?".

Ela foi reticente: "Te ligo daqui a pouco, pode ser? Vou falar com Paty e Marreco". Depois que ela retornou a ligação, disse: "Amiga, falei com eles, não dá. O carro está todo montado, cada coisa em seu canto, passamos horas encaixando tudo para caber, estamos cheios de coisa, não tem espaço mesmo, impossível". Ok, fazer o quê? Quase choro, mas o jeito era me conformar. Então Marreco me ligou: "Nada disso, a gente tira o que for preciso do carro, me dê dez minutos, vou rearrumar tudo". Aí, confirmada a possibilidade de enfiar eu e Angelo no Fiesta de Paty, Dany avisou: "Mas tem o seguinte: não dá para levar mala, nem mochila, não cabe. Traga uma sacolinha de mão com o que for indispensável. E rápido, estamos chegando aí".

Eu e Angelo corremos: abrimos a nossa linda malinha toda arrumadinha, arrancamos uma camiseta e uma bermuda cada um, calcinha e cueca, escova de dente e uma toalha. Vestimos calça, que era mais complicado de levar e que poderíamos querer na noite fria do Capão, e amarramos casaco na cintura. Sapato, só o do pé. Enfiei minha bota. Vamos nessa.

Foi um dos melhores fins de semana de minha vida. Mesmo fazendo a trilha da Fumaça com bota de cano alto, mesmo sem shampoo, mesmo com o aperto do carro, mesmo dormindo de calça jeans com uma mulher doida pelada no quarto do albergue. Foi indescritível. Maravilhoso.

Ah! Também fiquei feliz por ter lembrado de levar o sutiã, porque pude tomar banho na trilha sem criar qualquer tipo de escândalo.



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Fotitas, fotitas, fotitas:

















13 de março de 2007

Jesus! Como você é branca!

Hoje eu acabei conversando um monte com Fábio sobre a Bahia e sua cultura, especialmente a musical. Muita "filosofia" para ter saco de escrever aqui, mas, no fim das contas, mesmo tendo um monte de coisas para reclamar, o que geralmente me vem à mente quando falo do assunto é que eu acho o máximo ser baiana. Não é muito fácil ser uma baiana branquela, mas eu acho o máximo de verdade.

Eu sempre ri e fiz piada do fato de freqüentemente ser confundida com uma turista. Comentava: tá vendo? Quem manda não ter um pigmentozinho na pele em meio à negritude da terra? Mas meu argumento caiu por água abaixo quando Rita Assemany, uma morena com cara baianíssima, reclamou numa entrevista que, apesar de trabalhar no Pelourinho há anos, e de ser relativamente conhecida aqui no estado, ela ouve sempre, sempre, sempre, todos os dias, as mesmas ofertas de lembranças e badulaques dos ambulantes do Centro Histórico. Falam com ela em outras línguas e tudo. Achei que era privilégio meu ser abordada em Inglês, Espanhol, Francês e o escambau quando invento de passar pelos locais turísticos. Já vi que fui egocêntrica, haha.

Apesar de ter sido desfeita a minha teoria de que faço sucesso no Pelô porque não tenho a típica cara baiana, o fato é que quando passei um mês em São Paulo trabalhando, estudando e farreando, numa experiência super temporária de morar em outro estado, eu me senti muito mais integrada ao resto da população. Não há nada de preconceito no que estou dizendo, por favor. A questão é que é mesmo super raro eu me reconhecer em alguém aqui na cidade. Isto é sério, poderia ter me gerado traumas e tudo. E foi uma delícia maravilhosa passar um mês inteirinho sem ouvir nenhum comentário escandalizado sobre a minha brancura. Eu bem sei o que sofrem os muito altos, os muito baixos, os muito gordos, os muitos magros - enfim. Conheço umas figuras que não têm chances de sair de casa sem se deparar com olhares surpresos e as mesmas frases de sempre: "nooooooooossa, como você é alto!". Isso não se faz, minha gente.

Sou branca, sou branca, branquérrima, transparente, eu já sei, não precisa me dizer. Sim, eu já notei que dá para ver as veias em alguns lugares. Sim, é claro que percebo que qualquer apertãozinho me deixa vermelha. Não, eu não vou criar o hábito de tomar sol para pegar uma corzinha e disfarçar a palidez, quem disse que quero disfarçar alguma coisa, ora bolas! Tá querendo dizer o quê, hein?? Com exceção do Michael Jackson, quem é preto não tem como ficar branco, então por que eu, branca, tenho de ficar preta?