22 de abril de 2008

Vamos ao teatro?

Vamos.
Temi quando o flyer me avisou que eu iria chorar. Não estou boa para isso, não. Fiquei tensa.
Só que eu não chorei, nem gostei muito.

Ao final, recebemos mais um panfletinho, que guardei nem sei porquê.
Vinte e quatro horas depois, resolvo ler. Me deparo com um texto que eu estava há dias tentando construir na minha mente. Seria um plágio feito através de leitura de pensamento caso não tivesse sido escrito em 1974.

Compartilho.

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Movimento dezesseis. Eu sei que fui tão fraca quanto um diálogo de bêbados, tão torpe quanto uma reticências, tão vil quanto um copo mal tomado.

Dói-me a palavra superar que falaste em meu nome. Dói-me o beijo negado. Dói-me o termo acontecido. Dói-me essa coisa que é a tua verdade e jamais será a minha. Digo-te compreensiva: compreendo. E compreensiva sofro as tuas decisões. Quantas noites me serão entregues para que eu as regue com esse furor existencial e louco? De quem falarás em meu nome para confortar a tua angústia? Não vês que sou um ser humano que expele flores e fugas com a mesma intensidade? Tudo tem sido igual desde o princípio. Nada tem mudado para este pobre cérebro privilegiado. Para esta triste cabeça maravilhosa. E eu estou farta de sonhar tudo aquilo que não deverá acontecer. O apolíneo da vida tem me eriçado os cabelos. Tem me atormentado e enlouquecido. Tem.

Mas não te culpes. Quando te escolhi não te deixei o encargo de me fazeres feliz. Seria complicado. Eu esperava apenas sensações puríssimas e isto se deu. Portanto faze-me sofrer se queres. Posso suportar o sofrimento com um estoicismo digno dos profetas. Faze-me repetir que amo oitocentos milhões de vezes usando para cada uma delas as vozes esdrúxulas de um velho barqueiro do Pireu ou de uma esganiçada garota propaganda. Faze-me ajoelhar sobre este joelho quase mecânico que sobrou do último acidente e dizer-te mais uma vez que deus é o fruto de minhas angústias diárias. Que existes tu. Que tu és a luz e a verdade. Essa verdade que temo encontrar mas que procuro como se a identidade.

Faze-me feliz se queres. Se não queres faze-me infeliz. Se nada queres vai para que eu sofra como tenho sofrido cada abandono. Nada direi do teu abandono que forjei. Não te acusarei como tenho acusado minhas mais torpes realizações. Para mim foste o princípio de uma pureza que eu jamais chegarei a acreditar que exista. Para mim foste a cor e todos os cinemas e casacos do mundo e o amarelo das cervejas e o vermelho do vinho e o arco-íris da felicidade. Para mim foste a cor como se antes eu não possuísse retina.

Mas não racionalize esta ida que te é difícil também. O amor existe ou não existe. Só é parcial a vontade de quem ama parcialmente.

Não nos outorguemos o direito de recriar a liberdade. Ela já é tão difícil falada nas prisões nos hospitais nas salas de estar. De star. Não vamos atormentá-la sob esse ar poluído que chamam de livre ou sobre os jardins públicos da cidade que pertencem a todos mas que a ninguém é dado caminhar sobre a grama. Vamos deixar a liberdade em paz e sentir e dizer apenas aquilo que está agora dentro de nossos sentidos. Se queres beijar bater acariciar morder cuspir que queiras o que queres. A recusa racional é um ato sórdido. Diga não quando teu corpo for um calafrio de repúdio e não puderes beijar a boca que te beija. Não racionalize os atos do amor. Eu ainda não aconteci em teus sentidos. Ainda sou aquela que atrai teu corpo para perto dos sofás dos carros blindados das mesas de bar. Com que direito analisas um ato que não entendes? Que não entendo?

Pretendo ser simples. Quero ser simples. Tenho dito da minha simplicidade com uma pureza insofismável. Tenho dito com essa pureza tudo aquilo que aprendi com a tua cor. Meu fardo é grande. E repito. Se queres faze-me sofrer. Dize-me: vai e eu irei sem palavras. Te beijarei a boca se quiseres. Farei amor contigo ou te mandarei a minha cabeça ensangüentada envolta em papel de seda para o teu álbum de artistas anônimos. Mas não racionalizes essa coisa pela qual cortarei a cabeça. Pela qual me arrebento agora. Pela qual me arremessarei ao fogo como Joana. Pela qual morderei as estátuas de ferro da praça da república. Pela qual morrerei. Não me espere superar uma crise que já teve o nome de amor. Não me proponhas a mediocridade ainda uma vez porque de ti veio a cor. Porque és a cor e da tua cor foi feito o meu princípio que outrora era o verbo. E hoje é uma infindável catarata de gestos ternos.

[Aninha Franco]

4 comentários:

  1. puxa vida.

    palavras de atitude. ação desnuda diante do sentir. lindo.

    me tocou, tem/teve a ver comigo...

    uh!

    é... mas é isso.

    :)

    bj Paulinha.

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  2. Putaquepariu!!!
    Eu tenho que ir dormir depois disso?

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  3. Velcro Power! A dor da Ro Rô!

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  4. Posso entrar na fila das pessoas que queriam ter escrito isso?!

    Lindoooo!!!!

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